
Muitas pessoas, público em geral, pacientes e até mesmo profissionais de saúde, associa a imagem da manipulação articular a um ato agressivo, com uso de força e que pode “acabar mal como nos filmes” como habitualmente brinco com os meus pacientes.
Mas, quer nos filmes, quer nos vídeos, as manobras são realizadas geralmente de forma inespecífica, com uso de força e com movimentos de grandes amplitudes.
A terapia manipulativa é uma técnica de terapia manual na qual se realiza um movimento passivo, dentro das amplitudes articulares anatómicas, de grande velocidade e curta amplitude, de forma a restituir mobilidade articular, quando uma articulação está em disfunção, ou seja com perda de mobilidade.
É uma técnica que não se consegue precisar quando começou a ser usada, mas os registos mais antigos, sugerem que foram usadas na Tailândia e no Egipto há cerca de 4000 anos, também referidas por Hipócrates (400 AC), Galeno, etc… É usada por todo o mundo, em várias abordagens de tratamento, mas atribuída principalmente à Osteopatia e Quiropraxia, mas também a terapeutas manuais.
O benefício da sua utilização, por exemplo em casos de dor lombar inespecífica, é amplamente reconhecido e comprovado,
Apesar de lhe ser atribuída comummente um efeito terapêutico mecânico, a manipulação articular vai muito além disso. Tem efeitos não só a nível articular, mas também ao nível muscular, fascial, neurológico, vascular, imunológico e metabólico.
O estiramento da cápsula articular que ocorre nesta técnica, produz uma estimulação dos recetores articulares de Pacini, que enviam uma informação através das fibras aferentes até ao corno posterior da medula espinal, onde ocorre uma inibição dos moto-neurónios alfa e gama, produzindo uma inibição reflexa do espasmo muscular que mantém a disfunção articular. Além disso, ocorre uma estimulação dos centros simpáticos e parassimpáticos do sistema nervoso utónomo, tendo efeitos ao nível vascular e fascial, sobretudo nas manipulações vertebrais.
Por este efeito neurofisiológico, as consequências da manipulação não ocorrem apenas a nível local, mas também à distância, uma vez que ao libertar uma articulação hipomóvel que estaria a gerar uma compensação numa estrutura vizinha, os tecidos que mantêm essa compensação,
relaxam de forma reflexa. Além disso, no caso da manipulação vertebral, existe uma reação reflexa nos elementos inervados por esse mesmo nível vertebral.
Posto isto, os principais efeitos da manipulação articular são: aumento da mobilidade articular, diminuição da tensão tecidular e espasmo uscular, diminuição da dor, estimulação de mecanorecetores e gânglios simpáticos do sistema neurovegetativo.
O ruído articular, que geralmente é audível nestas manobras, é resultado de um fenómeno de cavitação ou de vácuo na cápsula articular das articulações sinoviais, em que o líquido sinovial passa a estado gasoso por um curto período de tempo.
É muitas vezes considerado um indicador do sucesso da técnica, contudo há estudos que demonstram que a restituição da mobilidade e o efeito da técnica é semelhante com ou sem ruído articular.
De qualquer forma, há muitas vezes uma reação de desapontamento e insatisfação por parte dos pacientes quando o ruído não é produzido. Mas, na verdade, o importante é que haja restituição da mobilidade articular e diminuição da dor e da tensão dos tecidos.
Relativamente aos riscos associados à técnica, a literatura não é consensual, embora a maior parte dos estudos concluam que não há risco associado às manobras de manipulação. De qualquer das formas, quando é feita com sentido de responsabilidade, respeitando as contraindicações, a resistência dos tecidos, usando menos força e acima de tudo, adaptando a técnica ao tecido (e não o contrário) o potencial risco é fortemente minimizado.
Na minha prática clínica, é uma ferramenta que uso com muita frequência, quer pelos seus efeitos, quer pela rapidez dos seus resultados.
E, pessoalmente, sou defensor e “praticante” da manipulação com gentileza, delicadeza e suavidade. Sim! É possível realizar manipulação articular com gentileza. E é precisamente esse o feedback que recebo constantemente pelos pacientes.
O movimento na manipulação não deve ser imposto, obrigado ou forçado! Caso contrário, o nosso sistema resiste ao que lhe é imposto, contraria. E dessa forma, não há respeito pelos tecidos. Portanto, com gentileza, além da maior segurança, tem outras duas grandes vantagens: menor reação de proteção por parte do paciente e respeito pela tensão, elasticidade e resistência dos tecidos.
Em suma, a manipulação articular é uma ferramenta muito útil e eficaz, mas é apenas uma ferramenta! O raciocínio clínico é o elemento determinante para o seu sucesso. Além disso, abre uma janela de intervenção enorme, permitindo ter um efeito não só mecânico, mas também
neurofisiológico, criando uma janela de oportunidade para que as outras técnicas de tratamento tenham maior alcance, efeito e integração.